Na praça pública, Sócrates interrogava os homens e instigava-os a refletir sobre si e sobre o mundo. Sócrates foi uma figura misteriosa, que questionava as pessoas que encontrava dizendo buscar a verdade. Conforme acentua Lefebvre, (1969, p. 11) “(...) voltando-se para fora e para o público, Sócrates interroga os atores para saber se eles sabem exatamente porque arriscam suas vidas, a felicidade ou a falta de felicidade (...)”, assim como a felicidade dos outros. Sócrates é aquele que chega de mansinho e, sem que se espere, lança uma pergunta que faz o sujeito olhar para si e perguntar: afinal, o que faço aqui? É isso o que realmente procuro ou desejo?
O que é a ironia socrática? O próprio Sócrates, nos diálogos platônicos, diz que seu destino é investigar, já que a única verdade que detém é a certeza de que nada sabe. Interrogava, portanto, para saber e, empenhado nessa tarefa, não raro surpreendia as pessoas em contradições, resultantes de crenças aceitas de modo dogmático, de pretensas verdades admitidas sem crítica.
A ironia tinha que ser acompanhada da maiêutica, isto é, o método socrático constituía-se de duas partes: a primeira mostrava os limites, as falhas, os preconceitos do pensamento comum e a segunda iniciava no processo de busca da verdadeira sabedoria. Numa situação de conflito e de incertezas o ironista, depois de realizar o exercício da desconstrução e da negatividade, deve ajudar as pessoas a darem a luz às verdades que, no entender de Sócrates, traziam dentro de si. O exercício do filosofar, a partir das verdades encontradas, abria caminhos para múltiplas possibilidades de escolha e ação.
As perguntas de Sócrates não visavam confundir as pessoas e ridicularizar seu conhecimento das coisas, mas, motivá-las a alcançar um conhecimento mais profundo, não só de si próprias, mas também dos outros, dos objetos e do mundo que as rodeava, provocando nelas novas ideias. Essa era a sua maneira de filosofar, sua “arte de partejar”, de ajudar as pessoas a parir, a dar a luz às novas ideias, arte que dizia ter aprendido com sua mãe, que ajudava as mulheres a dar a luz aos seus filhos. A interrogação de Sócrates expunha os saberes dos sujeitos e, ao mesmo tempo, mostrava o quanto as pessoas não tinham consciência daquilo que realmente sabiam.
Essa atitude, como dizem os historiadores, fez de Sócrates uma figura singular e lhe angariou alguns amigos e muitos inimigos. Embora parecesse neutra e sem um objetivo preciso (Sócrates parecia não ser partidário de nenhuma das tendências da época e não defendeu explicitamente nenhum regime político), essa atitude questionava poderes instituídos, valores consolidados e, por isso, também pedia mudanças. Com a ironia, ao trazer à tona os limites dos argumentos comuns, ao mostrar as contradições ocultas na ordem comumente aceita, ao revelar, ao abalar as certezas que fundavam o cotidiano, Sócrates convida ao filosofar como um processo metódico de elaboração de novos saberes.
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